Despedida
E no meio dessa confusão
alguém partiu sem se despedir; foi triste.
Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste,
talvez tenha sido melhor assim,
uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval
uma pessoa se perde da outra,
procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão.
É melhor para os amantes pensar
que a última vez que se encontraram se amaram muito
depois apenas aconteceu que não se encontraram mais.
Eles não se despediram,
a vida é que os despediu,
cada um para seu lado
sem glória nem humilhação.
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza,
e também uma lembrança boa;
que não será proibido confessar
que às vezes se tem saudades;
nem será odioso dizer que a separação
ao mesmo tempo nos traz
um inexplicável sentimento de alívio,
e de sossego; e um indefinível remorso;
e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram,
mas não se perderam,
porque ficaram em nossa vida;
que a lembrança deles
nos faz sentir maior a nossa solidão;
mas que essa solidão ficou menos infeliz:
que importa que uma estrela já esteja morta
se ela ainda brilha no fundo de nossa noite
e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar
que haverá outros verões; se eles vierem,
nós os receberemos obedientes
como as cigarras e as paineiras
com flores e cantos.
O inverno
te lembras...
nos maltratou; não havia flores, não havia mar,
e fomos sacudidos de um lado para outro
como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer
que houve um telefonema que não pôde haver;
entretanto, é possível que não adiantasse nada.
Para que explicações?
Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes;
o silêncio torna tudo menos penoso;
lembremos apenas as coisas douradas
e digamos apenas a pequena palavra: ADEUS.
A pequena palavra que se alonga
como um canto de cigarra
perdido numa tarde de domingo.
Rubem Braga
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